MENU
Estação Ferroviária de Marabá é reprovada em perícia
04/02/2016 09:46 em Notícias

Estação Ferroviária da Vale em Marabá é reprovada em perícia

Perita do IML dá nota vermelha à acessibilidade e reclama que mineradora dificulta análise técnica do trem de passageiros

Como na profecia bíblica de Daniel sobre o rei Belsazar, de Babilônia: “Pesado foste na balança e achado em falta”, a mineradora Vale também foi avaliada e reprovada no que tange à acessibilidade de cadeirantes na Estação Ferroviária de Marabá.

Uma mão misteriosa (dedo de Deus) assinou o fim do Império babilônico numa parede durante uma festa oferecida por Belsazar com a frase “Mene Mene, tequel ufarsim”. Em Marabá, quem decretou que a Estação Ferroviária da Companhia Vale não está adequada ao uso de pessoas portadoras de necessidades especiais foi a perita criminal Rosária Lana de Oliveira Lima, do Centro de Perícias Científicas “Renato Chaves”, que foi ao local a pedido da 13ª Promotoria de Justiça dos Interditados e Incapazes, Pessoas com Deficiência e Idosos de Marabá, que tem à frente a promotora Lilian Viana Freire.

A perícia usou como base as NBR’s (Normas Técnicas) 14020 e 9050, avaliando a acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. A Estação de Passageiros da Vale está localizada no km 738 da Estrada de Ferro Carajás, a cerca de 12 km do centro da cidade.

A Vale oferece um vagão exclusivo para portadores de necessidades especiais e mobilidade reduzida e ainda um acompanhante para esses passageiros. Todavia, a perita não conseguiu avaliar acessibilidade nesse vagão porque a empresa só concedeu dez minutos a ela para realizar um trabalho que precisa de mais tempo.

Em primeiro lugar, a perita chamou a atenção que a área de estacionamento para automóveis não há marcações estabelecidas, apenas um grande terreno ao lado da Estação Ferroviária onde os carros estacionam sem limitações para automóveis. Há ainda uma área prevista para ônibus.

Não está estabelecido onde fica a entrada nem a saída, direção da mão dos veículos ou placas de sinalização. Há apenas uma vaga para portadores de necessidades especiais, mas ela não atende as normas estabelecidas pela NBR 9050, a qual estabelece que o estacionamento precisa contar com um espaço adicional de circulação com o mínimo 1,20 metro de largura quando afastada da faixa de travessia de pedestres. Esse espaço pode ser compartilhado por duas vagas, o que não é o caso da Estação Ferroviária de Marabá.

A área de chegada de automóveis para embarque e desembarque também foi reprovada. Segundo a perita criminal Rosária Lana de Oliveira, ela possui rebaixamento de calçada com sinalização para pessoas portadoras de necessidades especiais, porém não há sinalização tátil. O leito carroçável pavimentado com pedras e em estado ruim de conservação dificulta a transição para a rampa de acesso.

Também há irregularidades no acesso dos passageiros portadores de necessidades especiais que chegam de ônibus ou de táxi. O acesso ao primeiro é através de escadas inapropriadas e no caso do segundo, falta estrutura para deslocamento dos usuários em geral, principalmente os de mobilidade reduzida.

Rampas

A perita do Renato Chaves também analisou as rampas de acesso aos portadores de necessidades especiais e alertou que elas estão fora do padrão aceitável pela NBR 9050. A dimensão atual é de 1,23 metro, enquanto o estabelecido é de 1,50 metro. No caso da rampa de descida de passageiros com bagagens, esta não tem corrimão, com inclinação inadequada, sem qualquer sinalização tátil. Esse é, também, o problema das escadas de acesso entre o estacionamento de táxi e a estação: sem corrimão e com inclinação inadequada.

A calçada adjacente à entrada da estação também foi reprovada. Segundo a perícia, o piso é argamassado de grande densidade e elevada resistência à abrasão e a impactos frequentes, mas a superfície é lisa, em desacordo com a NBR 9050.

Passageiros correm sério risco de choque elétrico

Dentro do prédio da Estação Ferroviária de Marabá, propriamente dita, a perícia identificou várias irregularidades quanto ao estabelecido pelas normas técnicas. Trata-se de um espaço com 1.300 metros quadrados de área coberta onde estão localizadas a bilheteria, cadeiras de espera, lanchonete, banheiros, entrega e retirada de bagagens e setor administrativo.

O mais preocupante para a perita Rosária Lana, do Centro de Perícias Científicas Renato Chaves é que há uma situação de “considerável risco” na Estação Ferroviária de Marabá, pois existem algumas portas com sinalização de perigo de alta voltagem, para as quais não há barreira que impeça a aproximação física por parte dos transeuntes.

As portas são frágeis, do tipo venezianas, que proporcionam passagem de objeto ou instrumento de espessura fina, colocando em contato qualquer indivíduo, inclusive crianças.

Todavia, não há locais designados para portadores de necessidades especiais de acordo com o previsto na NBR 9050. Na lanchonete, não há espaço para atendimento de portadores de necessidades especiais, nem às mesas nem aos balcões.

O piso não está em conformidade com as normas estabelecidas e faltam placas de sinalização tátil para quem possui problemas de visão.

No local de venda de passagens há um guichê destinado aos portadores de necessidades, porém é preciso retirar os balizadores móveis para garantir a rotação da cadeira de rodas. Não há, ainda, banheiros destinados à categoria familiar ou unissex.

Na área específica de embarque de pessoas com mobilidade reduzida, além de crianças e seus acompanhantes, não há previsão de espaço para cadeirantes. Ao analisar a plataforma de embarque e desembarque no trem, a perita observou que a calçada estava bastante desgastada, assim como a sinalização tátil.

Também ficou comprovado que na área geral da estação, não há rotas de fugas de emergências, nem alertas sonoros ou visuais, assim como faltam telefones públicos instalados no local.

Chamou a atenção da perícia, ainda, o fato de que há uma caixa de instalações de proteção contra incêndio próxima à rota com sinalização tátil, onde não há sinalização de alerta, como orienta a NBR 9050.

Promotora diz que vai cobrar as adequações

Em entrevista exclusiva ao Jornal CORREIO para comentar a perícia realizada na Estação Ferroviária de Marabá, a promotora Lilian Viana Freire, da 13ª Promotoria de Justiça de Marabá, que cuida, entre outros, dos casos de pessoas com deficiência, explicou que diante de reclamações de algumas pessoas, em 2014, o MP passou a se interessar em avaliar tecnicamente a acessibilidade na Estação Ferroviária de Marabá.

Em documento entregue na Promotoria em maio de 2015, a Vale, através do escritório Albano Martins Advogados garante que cumpre com a garantia de acessibilidade de pessoas com deficiência nos trens de passageiros com destino a São Luís, inclusive de acordo com as NBRs 9050 e 14021, inclusive em todos os terminais de passageiros no trecho.

Em 13 de junho do ano passado enviou solicitação ao gerente do Centro de Perícias Científicas Renato Chaves solicitando a perícia no local.

Agora que o CPC Renato Chaves enviou seu relatório contradizendo a Vale, a promotora observa que vai cobrar da companhia as mudanças necessárias para que normas técnicas sejam cumpridas. 

Em nota, Vale alega que não há irregularidades

Em nota enviada ao jornal, a Vale faz esclarecimentos e nega que sua estação ferroviária tenha problemas de acessibilidade: leia à íntegra:

“A Vale esclarece que as estações de passageiros da Estrada de Ferro Carajás (EFC), a exemplo a unidade de Marabá, bem como o Trem de Passageiros oferecem acessibilidade às Pessoas com Deficiência (PCD). O prédio da estação de passageiros de Marabá possui espaço amplo e coberto para os pontos de embarque / desembarque, venda de passagens, lanchonete, dentre outros.

No estacionamento há vaga reservada à cadeirante, assim como a rampa de acesso está dentro do limite estabelecido pela NBR 9050. Na área de venda de passagens, há guichê exclusivo para pessoas portadoras de deficiência, assim como banheiros individualizados para ambos os sexos.

A empresa respeita e está atenta às necessidades das pessoas com deficiência e/ou mobilidade reduzida, e vem sempre buscando implementar as melhorias necessárias.

A Vale informa, ainda, que não recebeu o laudo da perícia realizada na Estação de Passageiros da Estrada de Ferro Carajás de Marabá, solicitado pela Promotoria de Justiça de Marabá ao Centro de Perícias Cientificas Renato Chaves. A empresa aguardará o recebimento oficial do laudo, para conhecer e apresentar sua manifestação perante o Ministério Público.

Com relação ao Trem de Passageiros, a Vale informa que o tempo de permanência na estação de Marabá é de 10 minutos, de acordo com regulamentação para o setor feita pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).  A Vale se colocou à disposição dos peritos do Renato Chaves para que a inspeção fosse realizada a bordo do trem em viagem e sem prejuízo aos usuários e a continuidade do serviço público, o que fora recusado pelos mesmos. A empresa permanece à disposição do Centro de Perícia para nova vistoria com dia e horários previamente agendados, e desde que não haja prejuízo ao transporte público de passageiros.

Sobre o novo trem de passageiros

A Vale iniciou a operação definitiva do novo trem de passageiros da Estrada de Ferro Carajás (EFC) em setembro de 2015. Foram adquiridos 39 carros, sendo seis executivos, 21 econômicos e 12 de serviços; equipados com lanchonete, restaurante, área especial para cadeirantes, bagageiro e gerador. As novidades contemplam também os carros-restaurante e cadeirante.

Dos itens considerados modernos, destaca-se o novo sistema de abertura e fechamento das portas externas, bem como as localizadas entre um carro e outro, que é automático. A travessia entre os carros também ficou ainda mais segura e confortável. Os novos carros de passageiros são equipados com displays externos e internos que exibem informações gerais sobre a viagem. Dados como destino e trajeto do trem, número dos carros, estações e paradas de embarque e de desembarque são algumas das orientações, agora disponíveis, que tem como objetivo facilitar ainda mais a viagem.

O trem parte da Estação Ferroviária de São Luís (MA) com destino a Parauapebas, no sudeste do Pará, às segundas-feiras, quintas-feiras e sábados. Às terças-feiras, sextas-feiras e aos domingos, realiza o percurso de volta. Só não há viagem na quarta-feira, pois neste dia realizada é feita a manutenção dos carros e locomotivas.

A Vale opera com reserva de duas passagens interestaduais gratuitas para idosos por viagem. Quando esgotadas as duas passagens, os demais idosos têm direito a 50% nos bilhetes para os assentos da classe econômica, nos trechos interestaduais. Para tanto, é preciso que se comprove ter 60 anos ou mais e renda igual ou inferior a dois salários mínimos, conforme o Estatuto do Idoso - Decreto Federal Nº 5.934 e com a Resolução Nº 1692 da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), de outubro de 2006.

Pela internet ou pelo Alô Ferrovias (0800-285-7000), o passageiro obtém os horários de chegada e partida do trem, bem como os preços das passagens, dicas de viagem, mapa da ferrovia, locais de compra de bilhetes, entre outras informações.

O trem de passageiros transporta em média 1.300 passageiros por dia. Deste total, em Marabá, o fluxo médio na estação é de 350 passageiros por viagem”.

10 pecados de acessibilidade na Estação Ferroviária da Vale

1)      Estacionamento de cadeirantes não possui as medidas regulamentadas;

2)      Falta sinalização tátil na área de chegada de automóveis para embarque e desembarque;

3)      Portadores de necessidades especiais que chegam de ônibus ou táxi têm enorme dificuldades em acessar à estação;

4)      rampas e escadas de acesso aos portadores de necessidades especiais estão fora do padrão aceitável pela NBR 9050.

5)      Superfície do piso da calçada adjacente à entrada da estação é liso e pode provocar acidentes.

6)      Passageiros correm considerável risco, pois existem algumas portas com sinalização de perigo de alta voltagem, para as quais não há barreira que impeça a aproximação física por parte dos transeuntes;

7)      Na área de embarque de pessoas com mobilidade reduzida, não há previsão de espaço para cadeirantes;

8)      Plataforma de embarque e desembarque no trem está bastante desgastada, assim como a sinalização tátil;

9)      Na área geral da estação, não há rotas de fugas de emergências, nem alertas sonoros ou visuais;

10)   Na lanchonete, não há espaço para atendimento de portadores de necessidades especiais, nem nas mesas nem nos balcões.

Conselho deverá cobrar ação enérgica no caso

Um dos conselhos municipais mais atuantes do município, o dos Direitos da Pessoa com Deficiência terá reunião hoje, quinta-feira, 4, e um dos assuntos a serem discutidos deverá ser a acessibilidade à Estação Ferroviária de Marabá.

Edinaldo Bonfim Sales, conselheiro e ex-presidente da entidade, diz que vê com preocupação a manifestação da Vale alegando que não haja irregularidades de acessibilidade na Estação que opera em Marabá. “Quando uma empresa dessa magnitude, que tem responsabilidade social para cumprir e não cumpre, alega que não há problemas, ela está dizendo para a comunidade que a gente que se vire. Só a recomendação do Ministério Público não vai adiantar, vamos ter de ir à Justiça para garantir a acessibilidade à Estação Ferroviária de Marabá”, avisou.

Ele disse que a comunidade de portadores de necessidades vivem um dilema atrás do outro na cidade. A passarela é um dos problemas mais escandalosos, na sua visão. “Técnicos da Sevop disseram que estava tudo dentro da lei. Uma perícia foi feita e ela foi condenada. Mesmo com todas as irregularidades apontadas pelos peritos, a obra está sendo preparada para inauguração (pasmen). “Isso mesmo depois de terem feito mea culpa e reconhecidas as deficiências””, adverte.

Ele lembrou também que foi feito relatório pelo Conselho da Pessoa com Deficiência apontando deficiências de acessibilidade ao Shopping Pátio Marabá e eles não respeitam os direitos. “Há problemas em estacionamentos e em outros setores”, observa.

Edinaldo avisa que as atuações do Conselho vão continuar e o Ministério Público terá de mover mais ações civis públicas contra empresas e entidades públicas que não cumprem a legislação.

(Ulisses Pompeu)

COMENTÁRIOS