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"Quando líderes são formados do dia para a noite, temos o impeachment"
05/10/2018 22:28 em Notícias

Aos 88 anos, e pela primeira vez em 63 anos sem um mandato eletivo, o ex-presidente afirma que o Brasil não vive uma democracia atualmente

Por Lydia Medeiros (Revista Época)

Há 30 anos, quando o país comemorava a promulgação da Constituição que Ulysses Guimarães chamou de “cidadã”, José Sarney, o então presidente da República, foi contra a corrente de otimismo que dominava o país. Declarou que a Carta, símbolo da passagem para a democracia, tornaria o Brasil ingovernável. Aos 88 anos, e pela primeira vez em 63 anos sem um mandato eletivo, o mais longevo político do país confirma hoje as críticas feitas à época, e é ainda mais incisivo: “Não podemos desconhecer que não estamos vivendo uma democracia com a expansão de poderes que a Constituinte proporcionou. Hoje, os poderes estão em expansão, ninguém controla, e um resolve dissolver o outro”. Sarney contesta até a ideia corrente de que a Carta de 88 proporcionou ao Brasil 30 anos de normalidade institucional. “Assegurou como? Dois impeachments de presidente! A instabilidade foi uma marca, e os problemas políticos resultaram em duas coisas gravíssimas: judicializamos a política e politizamos a Justiça.” Apesar da inquietação com os rumos da democracia, o ex-presidente e ex-senador afasta o risco de intervenções das Forças Armadas na política: “Os militares hoje sabem que o poder civil é a síntese de todos os poderes.” Ele vê no sistema político a raiz da atual crise. Afirma que faltam representatividade e democracia interna aos partidos. Compara o momento a outros períodos turbulentos que viveu, como o suicídio de Getulio Vargas e a renúncia de Jânio Quadros, e lamenta a falta de diálogo: “Os políticos não eram inimigos, eram adversários. Acima disso estava o país”. Sarney evita comentar a disputa eleitoral pelo Planalto, mas afirma que faltam líderes e solta uma ironia sobre tentativas de  buscar o “novo”: “Ninguém faz lideranças do dia para a noite, nem programas de auditório”. Quando são formados assim, conclui, o resultado é desastroso: “É o impeachment”.

 

Trinta anos depois, o pacto político que resultou na Constituição precisa de uma revisão?

 

 

Aquilo correspondeu a um momento histórico da transição democrática, para que fosse feita sem traumas. Assinamos o compromisso da Aliança Democrática, que era formada por uma parte do PFL, a Frente Liberal, e pelo MDB. Dentro desse pacto estão as obrigações que Tancredo [Neves] iria cumprir. Dentre elas, a convocação da Constituinte. Muitos interlocutores de Tancredo — a mim ele nunca disse — afirmaram em entrevistas e depoimentos que ouviram dele que não iria fazer a Constituinte.

 

Preferia reformas.

 

Reformas pontuais, porque ele tinha a ideia — que eu tenho, histórica — de que as Constituintes no Brasil, como no mundo, são momentos traumáticos. É o momento em que todos desejam que a Constituição resolva todos os problemas, logo e já. Hoje é inteiramente diferente. O que estamos sofrendo, a meu ver, é resultado da Constituição de 88, que eu — que não queria ser profeta, mas fui — disse que tornaria o Brasil ingovernável. E realmente tornou. Ao longo desses 30 anos, foi cumprindo, num processo de expansão, aqueles erros originais que ela tinha, e que desembocaram no estado atual que o país vive, e que não sabemos onde vai parar. Mas penso que é um encontro com o futuro — poderei não estar mais vivo, porque minha idade é um pouquinho avançada. Denunciei, quando senador, que estávamos marchando celeremente para uma ruptura. Não posso saber qual será, mas, que será uma ruptura, será.

 

Como a  Constituição contribuiu para a atual crise  e o que pode levar a uma ruptura?

 

A Constituinte foi feita para, utopicamente, acabar com as injustiças, com os privilégios e conter as Forças Armadas, retirando delas todas as suas atribuições. E foi feita com os olhos no retrovisor, voltados para o passado, muito marcada por um ressentimento do período militar que tínhamos atravessado. Acho que os ideais utópicos são sempre muito generosos, todos comungamos deles. Mas a Constituição não tem o poder de realizá-los. Houve uma transformação durante a Constituinte, de que uma demagogia populista pudesse se sobrepor à realidade dos fatos. Ela também foi marcada por luta interna entre Ulysses Guimarães e Mario Covas, que não aparecia ao público. E houve uma esperteza regimental, que quiseram fazer, de criar uma Comissão de Sistematização que fosse a dona da Constituinte, que fizesse a Constituição sem que o plenário a aprovasse. Bastavam 11 votos nas subcomissões, formadas por 20 membros, para aprovar determinado assunto. Esses iam para a Comissão de Sistematização, que, por sua vez, tinha 80 integrantes. Então, por 41 votos um tema era aprovado. E qualquer aprovação da Sistematização só poderia ser derrubada por dois terços do plenário.

 

A minoria ficou maior do que a maioria.

 

Isso fez com que se deformasse a Constituição. O resultado é que saiu o "projeto Frankenstein" [o texto da Comissão de Sistematização], como a imprensa mesma chamou.

 

Aí surgiu o centrão.

 

Depois botaram o nome de centrão, mas foi, na verdade, uma reação da maioria contra esse projeto que não representava a maioria da Constituinte. Isso criou um impasse. Não íamos ter Constituição.  Até então, eu não havia participado, mas tive de entrar, para viabilizar o término da Constituição. Eu achava importantíssimo que fosse concluída. Se eu não tivesse feito isso, nunca teríamos a Constituição. Ulysses conviveu com as duas coisas: a existência do que se chamou centrão e o processo que ele adotara, de jogar para as leis complementares e ordinárias aquilo que eram incapazes de resolver. Se não tivesse isso, não tinha Constituição.

 

 

Quais as maiores deformações produzidas?

 

Criaram o Regime Único para o funcionalismo público. Isso constitucionalizou privilégios. Ao mesmo tempo, a parte econômico-financeira. Diz o [senador] José Serra que não conhece nenhuma Constituição que tenha um capítulo sobre economia e finanças. Chegou ao cúmulo de eles aprovarem juros de 12%. Num mundo globalizado, a Constituição adotou uma posição retrógrada. Não mexeu no sistema político. Ficou localizada no passado, e o resultado é que ficamos com esse sistema do século XIX, com o voto proporcional. Um sistema que levou à corrupção, à desintegração dos partidos, à própria desintegração do regime e a uma ameaça à democracia. Hoje, não podemos, absolutamente, desconhecer que não estamos vivendo uma democracia com a expansão dos Poderes que a Constituinte deu.

 

O Judiciário tem poder demais no país?

 

O Executivo tentou agregar funções legislativas com uma coisa terrível, que são as Medidas Provisórias. Essas destruíram o Congresso e o próprio Executivo, que passou a legislar, e o Legislativo, em troca, também passou a invadir as competências do Executivo. Isso criou o impasse que vivemos até hoje. Com as Medidas Provisórias é impossível governar. E, sem elas, também. Hoje é mais fácil reformar a Constituição do que fazer uma lei ordinária no Congresso. E o resultado é que, atualmente, já passaram 3 mil propostas de Emenda à Constituição pelo Congresso.

 

Como o senhor imaginava a Constituição?

 

Pensei que nossa grande tarefa eram os direitos sociais. Já na convocação da Constituinte eu tinha essa visão. Precisávamos avançar. Na primeira Constituição do Brasil, o ponto era o direito à propriedade. Na Constituição republicana, os direitos individuais. E em 88 era a hora de termos direitos sociais. Faço uma ressalva, eu que fui um crítico da Constituição e estou sendo coerente na minha visão. Os capítulos que tratam dos direitos individuais e dos direitos sociais são um grande avanço. Transformaram a Constituição numa das melhores do mundo nesses aspectos. Isso assegurou o exercício da cidadania, o que talvez seja a melhor coisa que a Constituição fez. O defeito é que ela não partiu de um projeto inicial. Nenhuma Constituição no mundo pode ser feita como aconteceu aqui, de uma maneira anárquica. Ia formar-se o projeto dentro da Constituinte, submetido aos grupos de pressão. Eu me recordo de que Ulysses me disse, no fim dos trabalhos: "Por aqui passaram, presidente Sarney, 10 milhões de pessoas". E eu disse a ele: "Se eu já estava preocupado, agora você aumenta muito mais minhas preocupações". Porque a única Constituição que sobrevive há mais de 200 anos, a Constituição americana, foi feita por 55 pessoas. A Constituição é um pacto feito na sociedade, pacto de direitos e deveres. Deve se resumir a isso. Como atingir esses objetivos é do dia a dia, do tempo, do mundo que se transforma. Por isso a Constituição americana tem 200 anos: ela parte de princípios imutáveis, e as adaptações são leis ordinárias. A nossa, não. Ulysses não quis aceitar o anteprojeto feito pela Comissão de Notáveis, e eu não tinha condições políticas de enfrentá-lo. Na realidade, assumi formalmente o governo, mas o poder ficou nas mãos de Ulysses. Era o presidente da Câmara, presidente da Constituinte, presidente do PMDB.

 

O que o senhor achou das declarações do candidato a vice de Jair Bolsonaro, general Mourão, que disse não ser necessário haver participação do Congresso para fazer uma Constituição?

 

É um absurdo. Toda Constituição tem de ser feita pelo povo, que delega poderes aos constituintes. O que faltou na nossa foi, primeiro, um projeto inicial. Segundo, uma visão de como deveria ser feita. Havia o idealismo, porque estávamos construindo um novo tempo, e ficamos querendo corrigir os erros do passado e resolver os problemas do presente. Na verdade, a Constituinte passou a ser uma festa e um palco para uma campanha presidencial. Daí o centro das discussões ter sido o meu mandato. Quando, na verdade, foi uma ingenuidade minha, um pouco do intelectual. Eu conhecia a História do Brasil. E o Dutra [Eurico Gaspar Dutra], quando houve o fim da ditadura de Getulio Vargas, foi eleito presidente com mandato de seis anos, como previa a Constituição de 37. Com a Constituição de 46, ele pediu que reduzissem o mandato dele para cinco anos. Eu, achando que era um exemplo histórico, propus à Constituinte que fizesse isso. Eu achava o mandato de quatro anos muito curto. Tanto que depois fizeram a reeleição. Eu defendo realmente um mandato maior, que pode ser de cinco anos ou até de seis anos, como a França já teve. O resultado é que foi a grande discussão da Constituinte e levou a imprensa e todos a um erro histórico, dizer que eu queria aumentar meu mandato.

 

A atuação das corporações foi muito forte na Constituinte e ainda hoje é. Como romper com esse corporativismo em benefício da maioria?

 

Constitucionalizaram os privilégios e criaram outros. Criaram um Quarto Poder, por exemplo. Eu achava que o Ministério Público deveria realmente funcionar. Fui eu, quando presidente, que fiz a coisa mais importante que o Ministério Público tem até hoje, que é a ação civil pública. Deu poder extraordinário ao Ministério Público. Realmente,  houve uma expansão muito grande, mas sem controle. Os outros poderes têm um órgão de controle, e o Ministério Público, não. É o grande defeito. Esses são os erros da Constituição.

 

E na economia?

 

Esse sistema tributário, de tirar receitas da União para dar aos estados. No chamado projeto "Frankenstein", propuseram até fazer orçamentos regionais. Emendas que não precisavam indicar a fonte dos recursos. Eu dizia que o melhor artigo da Constituição era o que previa que fosse reformada em cinco anos. Mas, na época da reforma [1993], já era outro governo, que tinha outros interesses. Em vez de passar as receitas para os estados, resolveu tomar dos estados. Inventou as contribuições em vez dos impostos. Isso quebrou a Federação. De tal modo, que vemos dentro do país hoje um sistema contracionista, em que nós desintegramos a Federação. Estados mais pobres ficaram sem recursos. Fizemos a crise da Federação.

 

Essa redistribuição precisa ser refeita?

 

Precisa. Desapareceu o significado dos checks and balances (freios e contrapesos) que os  americanos criaram. Temos de ter um poder e temos de ter restrições a esse poder. Quando Montesquieu pensou nesse sistema, pensou em poderes harmônicos e independentes entre si. Nós fizemos uma Constituição sem esses mecanismos de controle. Hoje, os poderes estão expansão, ninguém controla e um resolve dissolver o outro.

 

 

Esse desequilíbrio coloca a democracia em risco?

 

Com esse desequilíbrio, a democracia não funciona. Não funcionou no mundo inteiro, e não seria agora que nós iríamos descobrir um regime anárquico. Hoje, vemos a crise da representatividade, o Congresso não representa mais nada. Há proliferação dos partidos. E a Constituição não mexeu em um ponto sobre isso. Infelizmente, criamos um problema que o país terá muita dificuldade de superar. Uma geração só será pouco para superarmos. Sem mexer nas estruturas do Estado, esse processo de desintegração vai continuar em expansão.

 

O senhor defende uma nova Constituinte?

 

Há várias formas de ruptura. Uma é a desintegração dos poderes, o próprio Congresso querer estabelecer uma ditadura do Congresso; o Judiciário querer estabelecer uma ditadura do Judiciário, o Ministério Público, o TCU. Enfim, estamos num processo sem ver que solução tomar. Como pensar que um país possa viver com 39 partidos? Fizeram uma reforma para esta eleição que não funciona. O resultado foi radicalização. O país está dividido. A Nação não tem um ponto de coesão. Isso é terrível. E tudo isso, a meu ver, vem da Constituição de 88. Porque nós atravessamos o sistema do regime militar para o estado de direito sem dar instrumentos para esse estado de direito sobreviver e evitar isso.

 

Os militares ficaram muito tempo recolhidos, mas hoje vemos uma tentativa de protagonismo.

 

Eles jamais vão ter protagonismo. É um período encerrado, houve o fim do militarismo. Sou um grande admirador, como estudioso da História do Brasil, da presença das Forças Armadas. A elas devemos a unidade nacional. Mas o que foi o militarismo que veio com a República? No Império, tínhamos o Poder Moderador, que o imperador exercia, e o exerceu bem. Durante 50 anos, tivemos a oportunidade de formar este grande país. Veio a República, e aí desapareceu o Poder Moderador. Os militares achavam que eles deviam ter esse poder. É aquilo que o almirante Custódio José de Mello diz no seu livro: a destinação histórica das Forças Armadas. Fomos submetidos ao longo da história republicana às intervenções salvacionistas.

 

Acha que isso acabou?

 

Duas coisas foram importantes para acabar com isso. Primeiro, o presidente Castello Branco, quando reduziu o tempo de permanência  dos militares nos postos, evitando criar aquilo que se chama de o “exército chinês”, cada general era dono de seu exército. Segundo, foi no nosso período de transição. Quando quiseram fazer a transição contra as Forças Armadas, não deixei. Disse que tínhamos de fazê-la com as Forças Armadas. Porque, assim, não faríamos a transição. Existiam muitas restrições naquele tempo. Se eu sou o comandante em chefe, sou o comandante que vai defender seus subordinados, e ninguém tenha medo. Teve grande importância o general Leônidas Pires Gonçalves, que entendeu essa diretriz, e nós conseguimos levar os militares a se profissionalizar e  voltar aos quartéis. E hoje, mais do que ninguém, eles defendem a democracia e a Constituição. Todas as entrevistas que vejo são no sentido de que a linha é a Constituição. A Constituinte criou um problema, foi o mais grave do período, porque queriam tirar das Forças Armadas o poder de intervir na ordem interna. Superamos graças à compreensão dos chefes militares e dos constituintes. Isso acabou com o militarismo, que é a agregação do poder político ao poder militar. É aquilo que o Castello chamou de "vivandeiras de quartel". Os militares hoje sabem que o poder civil é a síntese de todos os poderes. A não ser que tenham de cumprir a missão constitucional, se o país chegar a um caos, coisa a que devemos estar atentos e não deixemos acontecer. Porque o país pode ir à guerra civil e, o que é pior, aquilo que temos evitado até hoje, haver terrorismo como solução de problemas políticos. Estamos fora disso.

 

Acredita que há espaço para o parlamentarismo?

 

Temos de mudar o sistema político. Ele é a raiz de toda esta crise. Da corrupção, da desintegração. Devo confessar: fui político a vida inteira, sou o mais longevo político da República, nenhum teve mais vivência nem mandatos, mas tenho de reconhecer que, na realidade, chegamos meio tristes, porque não resolvemos os problemas. O parlamentarismo é uma das formas que temos de controlar o excesso de poder. Quando temos crises, cai o governo. Dizem que a Constituição assegurou 30 anos de normalidade. Assegurou como? Dois impeachments de presidente! Isso é crise. A instabilidade foi uma marca, e os problemas políticos resultaram em duas coisas gravíssimas: judicializamos a política e politizamos a Justiça. Todo problema se leva à Justiça. Quem tem de resolver são os partidos, mas não existem partidos. Hoje eles não funcionam, são só a comissão executiva, não têm democracia interna. E isso é fundamental. A Constituição não teve a visão do mundo futuro. Já naquele tempo estávamos nos preparando para a sociedade da informação. Não vimos isso? Não nos preparamos. Nosso Ulysses, que era um grande homem, estava preocupado em transformar a Constituinte numa plataforma de sua candidatura à Presidência. E o resultado é que criou um impeachment na frente.

 

Faltam líderes?

 

Ninguém faz lideranças  do dia para a noite, nem programas de auditório. A revolução, o golpe, como queiram chamar, a pior coisa que fez foi extinguir os partidos, porque cortou pela cabeça as lideranças que havia, resultado de muitos e muitos anos. Com seus erros, mas ninguém é perfeito. Os políticos têm os defeitos que a sociedade tem.  Ouvi do grande Deng Xiaoping, o homem que talvez mais tenha me impressionado nos contatos que tive como presidente: "Vocês, do Ocidente, não sabem uma coisa que nós, do Oriente, sabemos". Fez uma pausa e disse: "O tempo existe". Precisa de tempo para que se possa formar lideranças políticas. E o resultado é que, quando são formadas do dia para noite, temos o impeachment. É a ideia do Brasil.

 

Olhando o quadro destas eleições, o senhor prevê um novo impeachment?

 

Já estou numa fase de não abrir discussões com ninguém. Tenho de, com o que vi e acompanhei, tirar minhas conclusões. Estou escrevendo um livro, O Brasil no seu labirinto , em que procuro dar um testemunho.

 

O senhor está pessimista?

 

Não posso, jamais, ser pessimista. Um país que me fez presidente, alguém saindo de uma cidade de 2 mil habitantes, do interior, sempre tem de ser otimista. Os países vivem momentos de contração, de contorções. Estamos vivendo um momento desses, talvez um dos mais difíceis, porque não temos instrumentos. Eu vi as crises ser formadas no Brasil. A crise de Getulio, a renúncia do Jânio; e vi os homens que tínhamos. Eles encontravam uma solução. Não eram inimigos, eram adversários, mas, acima disso, estava o país. E isso desapareceu. Saí do Congresso porque não tinha mais o que fazer. Falta diálogo, falta conversar. Há um vazio muito grande.

 

Do que o senhor se arrepende de ter feito — ou de não ter feito — nestas mais de seis décadas de política?

 

Hoje penso que deveria ter participado mais efetivamente da vida Constituinte, mas não o fiz porque, com minha formação moral e ética,  achei que deveria cumprir todos os compromissos que Tancredo havia deixado. Tanto que eu, que vinha da Frente Liberal, achei que deveria permanecer no PMDB, porque seria uma contrafação de minha parte se eu assimilasse o governo e resolvesse exercê-lo como pessoalmente achava que deveria.  Eu me submeti. Talvez nenhum homem na história do Brasil tenha tido tanto poder quanto Ulysses, como condestável da República. E no fim, quando a gente tem de tomar decisões que são impopulares, fiquei sozinho. E ele também ficou só.

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