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Advogados paraenses sentem os efeitos da reforma trabalhista
15/07/2019 01:24 em Notícias

"Quem tem o bom direito, quem tem realmente razão continua tendo acesso pleno à justiça, só que ele tem que escolher bem o profissional dele", declarou Daniel Cruz, presidente da ATEP (foto)

 

 

Sancionada há dois anos, a Reforma Trabalhista, instituída pela Lei nº 13.467, vigente desde 11 de novembro de 2017, provocou uma diminuição no número de novos processos na Justiça do Trabalho, de 33%, em todo o País, e 26,5% no Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (Pará e Amapá), na comparação entre os anos de 2017 e 2018, conforme informações do próprio Tribunal.

 

Algumas alterações na Lei exigiram mais cautela por parte dos trabalhadores e mudança no comportamento de alguns advogados, o que pode justificar os números. Ao mesmo tempo, essa queda fez com que alguns profissionais do direito trabalhista investissem em outras áreas de atuação.

 

"Eu acredito que vai haver uma nova readequação, vai ser estabelecido um novo patamar, onde os números do passado dificilmente vão se repetir e a justiça do trabalho dificilmente vai conseguir abraçar tantos advogados como no passado. Ela deixa de ser um direito em expansão, pra se tornar um direito mais estabilizado, como é o caso do direito civil, direito criminal e outros", avaliou o presidente da Associação dos Advogados Trabalhistas do Pará (ATEP), Daniel Rodrigues Cruz.

 

Ele observa que a Justiça do Trabalho teve uma explosão muito grande nas últimas décadas e se tornou o local onde os advogados mais tinham interesse de trabalhar, por ser rápida, célere e séria. Porém, como os empregados tinham uma isenção de custa total, alguns excessos eram cometidos.

 

Uma das principais mudanças provocadas pela reformar foi que, a partir dela, o trabalhador que ganha acima de 40% do teto da Previdência (R$ 2.335,78) corre o risco de pagar custas e honorários, se perder a ação.

 

Para Daniel, isso exige maior qualificação do processo ajuizado. "E o futuro da advocacia trabalhista é um futuro que vai continuar tendo espaço, mas o espaço vai existir nas pessoas bem qualificadas e que atuem bastante da forma extrajudicial, ou seja, antes do processo", declarou.

 

Por esse motivo, ele ressalta que a Atep tem investido na qualificação de seus profissionais e trouxe para Belém o Congresso Nacional da Advocacia Trabalhista, que será realizado em novembro, pela Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas.

 

Este ano, o tema será  “Ver-o-peso das reformas”, com o objetivo de analisar e debater os reflexos, o efeito e o que esperar do futuro após essa reforma trabalhista. Para Daniel Cruz, ela exigiu responsabilidade e cautela maior de advogados e clientes. "Por exemplo, empresas públicas, banco, Petrobrás, antigamente a pessoa estava lá trabalhando e chegava uma tese: a gente vai entrar com um processo porque parece que o nosso auxílio alimentação que é de 150 reais pode ser 500. Perdeu, nada acontecia. Automaticamente, aquele advogado que fazia aquela tese que era para evoluir não vai fazer mais, porque o grande prejuízo para o direito do trabalho é a estabilização da jurisprudência.

 

O advogado vai ser persuadido a ficar mais dentro do que é certo e não tentar algo novo. Vai caber esse avanço aos sindicatos, que são os únicos que têm teoricamente isenção de custa para ingressar com essa ação. O problema é que os sindicatos, pela reforma, também perderam sua maior fonte de arrecadação, que foi a contribuição sindical", explica. Mesmo sem números precisos, Daniel Cruz admite que muitos profissionais abriram negócios ou mudaram de área de atuação, como por exemplo para o direito previdenciário.

 

"Nós tivemos uma grande queda no número de advogados nessas regiões trabalhistas", declarou, citando cidades do interior, como Parauapebas e Marabá. Porém, o presidente da Atep afirma que a reforma não atacou o bom direito. "Quem tem o bom direito, quem tem realmente razão continua tendo acesso pleno à Justiça, só que ele tem que escolher bem o profissional dele, porque se ele escolher o profissional errado e tiver algum erro ele pode ter um prejuízo".

 

TRIBUNAL

 

O desembargador Vicente José Malheiros da Fonseca, decano TRT-8ª Região, observa que a Reforma Trabalhista não cumpriu um dos seus propósitos: reduzir o número de desempregados, como têm revelado as estatísticas. Além disso, ela não reduziu o número de conflitos entre o capital e o trabalho. "Reduziu, momentaneamente, as novas ações trabalhistas", enfatiza.

 

Para ele, a Justiça do Trabalho presta um relevante serviço público - como a saúde, segurança e educação pública – e, por esse motivo, as partes, num processo, não deveriam pagar despesas para o ajuizamento das ações e para a defesa de seus direitos. "Mas a reforma, praticamente, voltou a exigir do trabalhador a comprovação de insuficiência econômica. Uma espécie de “atestado de pobreza”, exigência formal já abolida desde o governo do Presidente João Figueiredo (na década de 80 do século XX), que passou a admitir a simples declaração do interessado, sob as penas da lei, no sentido de que não tem condições de arcar com as custas do processo, sem prejuízo do sustento próprio e de sua família".

 

Com a Lei 13.467/2017, Vicente Malheiros explica que o trabalhador que deixa de comparecer à audiência inaugural, além de ter a sua reclamação arquivada, terá que justificar a sua ausência e, ainda que beneficiário da justiça gratuita, deveria pagar as custas, inclusive como condição para o reajuizamento da reclamação.

 

"A rigor, o reclamante não teria que justificar a sua ausência à audiência, até porque já sofre a sanção do arquivamento do processo. Porém, a sua ausência pode resultar de inúmeros motivos: ele pode estar em novo emprego e tem receio de comentar com o novo empregador sobre a demanda na Justiça do Trabalho; ou que, desempregado, não tem condições financeiras para pagar o transporte; ou porque se atrasou no deslocamento até a Justiça, em virtude do trânsito, etc. Todavia, os juízes nem sempre aceitam essas justificativas, o que provoca a possibilidade de recurso ao Tribunal para discutir sobre a matéria".

 

O desembargador acredita que a Reforma Trabalhista acabou por dificultar o acesso do trabalhador à Justiça do Trabalho, o que viola norma pétrea constitucional. Outro ponto relevante apontado por ele é o ônus da sucumbência quanto aos honorários advocatícios, que praticamente não existia na Justiça do Trabalho.

 

"Ora, se o trabalhador geralmente não tem condições de pagar as custas, que correspondem a 2% sobre o valor da causa, imagine-se o ônus de pagar os honorários advocatícios, fixados entre 5% a 15% sobre o valor da reclamação. Na verdade, com a Reforma Trabalhista, o trabalhador ficou com medo de acionar a Justiça do Trabalho, pelo menos num primeiro momento, o que parece inadmissível num Estado Democrático de Direito".

 

Para ele, o ideal seria implantar a Defensoria Pública perante a Justiça do Trabalho, como ocorre junto a outros ramos do Poder Judiciário, para a defesa das pessoas necessitadas.

 

"Imagino também que se poderia adotar sistemas de prestigiar as ações coletivas, por meio de sindicatos – certamente bem aparelhados e qualificados para essa missão –, como ocorre em outros países".

 

Em 2017, na 8ª Região, foram ajuizadas 78.384 novas ações perante as Varas do Trabalho, enquanto que o Tribunal recebeu 18.836 novas demandas (sobretudo recursos), o que totaliza 99.237 novos processos. Em 2018, foram 50.913 no primeiro grau e 19.994 no segundo grau, no total de 72.925. Ou seja, no total, houve uma redução de 26.312 processos, de 2017 para 2018. Porém, ao se analisar apenas o movimento judiciário do segundo grau, verifica-se um aumento de 18.836 para 19.994 processos, no ano de 2018, em virtude do resíduo do ano anterior.

 

Para Vicente Malheiros, isso revela que a tendência é o crescimento da demanda trabalhista e uma possível estabilização nos próximos anos. Hoje, o TRT8 trabalha com um número reduzido de servidores, como destacado pelo Corregedor Geral da Justiça do Trabalho, ministro Lelio Bentes Corrêa, quando aqui esteve em Belém, no início de julho. Segundo Malheiros, o número de servidores, em cada um dos gabinetes dos desembargadores do Tribunal (hoje 22, porque persiste um cargo vago), encontra-se abaixo dos parâmetros fixados pela Resolução Administrativa nº 63/2010 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho.

 

Em razão da média de processos recebidos por Desembargador no triênio 2016/2018 (927), deveriam estar lotados entre 9 e 10 servidores, entretanto, há uma equipe de 5 servidores, por gabinete. Ainda assim, neste ano de 2019 (até 31 de março), o prazo médio nas Varas do Trabalho da 8° Região, do ajuizamento da ação até a prolação da sentença, foi de 128,4 dias, enquanto que a média nos Tribunais de médio porte (2º Grau), foi de 255,5 dias e, no País, de 276,6 dias. Isso mantém o TRT8 como referência nacional, sobretudo dentre os Tribunal Regionais do Trabalho de médio porte.

 

"O Tribunal também apresenta performance muito satisfatória quanto à média nacional nos índices de conciliação, na fase de execução e somos, ainda, pioneiros na prolação de sentenças e acórdãos líquidos, sistema implantado na época em que fui presidente no biênio de 1998-2000, o que agiliza bastante a tramitação processual, pois elimina o procedimento de apuração do valor devido ao credor trabalhista, na medida em que esse valor já é definido na própria decisão judicial", concluiu.

 

 

Fonte: O Liberal

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